A evolução dos primatas é uma história incrível!
Sabemos que nós humanos temos muitas características biológicas em comum com macacos, símios e prossímios. Isso ocorre porque somos todos pertencentes à mesma ordem: os primatas!
A ciência já entende, atualmente, que os primeiros primatas surgiram no início da Era Cenozoica (a qual data de 65 milhões de anos), e viviam em árvores. Pode-se inferir isso a partir das características ainda hoje compartilhadas pelos primatas, que veremos ao longo deste artigo, que são adaptações para a vida arbórea.
Mas nós não vivemos em árvores, não é mesmo?! Então vamos entender também a diversidade dos primatas, incluindo os humanos, e nossa evolução! Vamos lá?
Origem, história e evolução dos primatas
Para entender melhor esse fantástico e complexo grupo de animais, vamos contar a sua história desde o início. Conheça abaixo as mais antigas divisões dos primatas, sua origem e sua evolução.
■Origem
Os primatas surgiram em florestas, como um grupo bem sucedido espalhado por toda a Terra. No entanto, a partir do final do Eoceno (final da era Cenozoica), esse grupo de animais se concentrou na região tropical, muito provavelmente pela distribuição de seu habitat.
Acredita-se que os primeiros primatas tenham se originado de algum animal especializado em escalar galhos, devido ao comprimento do dedo e à posição do polegar; algo similar a um esquilo. Essa é a teoria mais aceita para explicar seu surgimento.
Esses primeiros mamíferos semelhantes aos primatas apresentavam tamanho reduzido, entre o tamanho de um sagui e de um mico-leão. Sua dieta era variada entre animais insetívoros (que se alimentam de insetos) ou onívoros. Esse grupo foi extinto, restando apenas seus irmãos, os primatas verdadeiros.
■Primeiros primatas
Os primeiros primatas verdadeiros são conhecidos como prossímios, e sabe-se que existem desde o início do Eoceno, na América do Norte, Eurásia e norte da África. Englobam os gálagos, lêmures, loris, pottos e tarsos.
Em geral, esses animais são de pequeno porte, de hábito noturno, com focinhos longos e cérebros relativamente pequenos, quando comparados aos macacos. Alguns deles são herbívoros, mas a maioria diversifica a dieta. A maior diversidade do grupo encontra-se entre os lêmures.
Os tipos primitivos de prossímios também foram extintos durante o Eoceno, pois não viviam em regiões tropicais. Já os prossímios atuais têm sua história pouco conhecida por seus registros fósseis, mas sabe-se que eles foram espalhados a partir dos trópicos do Velho Mundo, na região da África.
■Evolução dos strepsirrinos
O grupo strepsirrinos ou Strepsirhini é uma subordem formada pelos lemuroides e lorisoides. Seu nome vem do grego, e significa “nariz torcido” (Grego: strepsi = torcido; e rhin = nariz), e é essa característica do nariz que diferencia o grupo dos outros primatas.
Os strepsirrinos apresentam o lábio superior, gengiva e nariz ligados, formando uma única estrutura. Seus dentes também são diferenciados e adaptados para sua alimentação e manutenção da pelagem, como uma espécie de pente!
Hoje são conhecidas 91 espécies de strepsirrinos, divididas em 7 famílias, o que representa mais de um terço da diversidade dos primatas. Ainda em relação à diversidade, podem ser habilidosos saltadores (gálagos), escaladores lentos (loris), e alguns animais que podem andar por longas distâncias, equilibrados apenas em seus membros posteriores (propithecus).
■Evolução dos lêmures
O estudo dos lêmures é muito importante para entender a evolução e adaptação dos primatas. Isso porque eles são um grupo muito mais diverso do que os loris e os gálagos, apesar de aparentados. Das sete famílias de strepsirrinos existentes, cinco delas são lêmures, endêmicos de Madagascar.
Acredita-se que as condições climáticas e de vegetação da Ilha de Madagascar tenha orientado a evolução desse grupo. No entanto, os estudos sobre a história dos lêmures são dificultados pela falta de fósseis na região.
Até cerca de dois mil anos atrás, havia uma variedade muito maior de lêmures, incluindo espécies gigantes. No entanto, muitas foram extintas após a chegada de humanos à ilha, e consequente destruição de florestas.
■Evolução dos haplorrinos
Os haplorinos ou Haplorrhini (do Grego haplo - simples; e rhin = nariz) compreende as espécies de tarsos e antropoides. Suas narinas são ovais e divididas por uma membrana. Atualmente, só há uma família de tarsos viventes, a Tarsiidae.
Os antropoides apresentam estrutura corpórea maior que os prossímios, com cérebro também maiores. O mais antigo antropoide conhecido é o Eosimias, animal chinês de apenas 6 cm e peso de cerca de 10 g. Mesmo assim, ainda se discute se a origem dos antropoides se deu na Ásia ou na África.
O que se sabe é que houve uma radiação desses animais para outros continentes, com aumento de tamanho corpóreo e dieta rica em fibras. Algo que exige muito mais atividade de mastigação do que a dieta de seus ancestrais.
■Surgimento do gênero Homo
A primeira espécie do gênero Homo surgiu no leste do continente africano há, cerca de, 2,4 a 1,6 milhões de anos, e é chamada de Homo habilis (homem habilidoso). De tamanho menor que os humanos, era capaz de confeccionar artefatos utilizando rochas, daí o seu nome.
Esses primeiros hominídeos foram derivados de um grupo primitivo conhecido como australopithecines, que eram terrestres, vegetarianos e habitavam as savanas na África. Alguns cientistas consideram difícil a separação do grupo australopithecines e do homo.
A única espécie viva do gênero homo é o Homos sapiens sapiens (os seres humanos atuais), já que todas as outras sete espécies conhecidas foram extintas. Acredita-se que a espécie tenha surgido há cerca de 350 milhões de anos, também no continente africano.
Evolução no comportamento dos primatas
Dentre todos os grupos de mamíferos hoje conhecidos, os primatas destacam-se por seu comportamento social e sua capacidade de raciocínio. Alguns desses comportamentos são muito antigos e comuns em diversas espécies. Confira a seguir.
■Sistemas sociais
Os primatas não são os únicos vertebrados a apresentarem sistemas sociais complexos. Mas, há sim espécies de primatas que estabeleceram sociedades elaboradas e complexas, servindo como base para o estudo da própria evolução humana.
Pesquisas indicam que os sistemas sociais formados pelos primatas estão associados diretamente à sobrevivência de cada espécie, pois estão relacionados à distribuição dos recursos e às oportunidades de reprodução (no caso de grupos em que machos disputam as fêmeas).
Algumas características de cada espécie influenciam o estabelecimento dessas relações sociais, tais como: tipo de dieta, habitat, predadores, tamanho corpóreo e acasalamento. Por isso há tantas interações sociais diferentes quando comparamos, por exemplo, espécies de macacos. Essas relações são construídas de acordo com as necessidades de cada grupo.
■Comunicação e inteligência
Os primatas apresentam grande capacidade de assimilar diferentes sons de comunicação. Até mesmo símios e chimpanzés são capazes de aprender algumas palavras humanas e formar pequenas frases!
Acredita-se que essa capacidade esteja relacionada ao maior tamanho do cérebro dos animais desse grupo, que está relacionado à disponibilidade de recursos. Logo, os primatas mais bem adaptados e com maior disponibilidade de alimento puderam desenvolver cérebros maiores.
Há também estudos que indicam que a inteligência dos primatas está relacionada ao bipedalismo (andar sobre duas pernas), que influencia o tamanho do cérebro. Mas não foi fácil chegarmos ao nível de comunicação que temos hoje! Cientistas acreditam que o controle da fala só foi possível a partir da espécie Homo erectus, extinto há 300 mil anos.
■Uso de ferramentas
Já vimos aqui que o Homo habilis era capaz de produzir artefatos a partir de pedaços de pedra, certo? Entretanto, outras espécies de primatas, que não pertencem ao gênero Homo, também são capazes de utilizar ferramentas!
É o caso do macaco-prego (primatas do gênero Sapajus), que utiliza pedras como ferramentas para quebrar sementes e, assim, preparar sua refeição. Há registros fósseis que indicam que esses macacos utilizam ferramentas há, pelo menos, 3 mil anos!
Além disso, há outros exemplos de primatas que utilizam ferramentas para diversas finalidades. Os gorilas são capazes de usar galhos de árvores como apoio ao andar em determinados terrenos, e também para medir a profundidade de poças ou lagos. As varas também podem ser utilizadas por Bonobos e Chimpanzés para pescar ou derrubar frutas de árvores.
■Alimentação
A alimentação dos primatas é variada, e pode englobar carnes, ovos, sementes, frutas, e até mesmo flores. Uma característica em comum a todas as espécies é que, por serem mamíferos, recebem seus primeiros nutrientes do leite materno. Após o desmame, a dieta varia de acordo com o estilo e vida.
Primatas que vivem predominantemente em árvores, como lêmures, loris e algumas espécies de macacos, geralmente se alimentam de brotos, frutas e outras partes vegetais, podendo, também, pegar pequenas aves. A exceção são os társios, que ficam nas árvores durante o dia e, à noite, descem para caçar pequenos animais.
Há algumas espécies de macacos que podem se alimentar de ovos e também pescar ou caçar animais menores. Chimpanzés e Bonobos, mais próximos dos humanos, apresentam uma dieta mais adaptável.
■Predadores e presas
Os únicos primatas que são predadores obrigatórios são os társios, pois são carnívoros que se alimentam de cobras, crustáceos, insetos e outros pequenos vertebrados. Mesmo assim, encontramos hábito predatório em diversas espécies, incluindo a espécie humana, que ao longo de sua evolução teve a caça como principal fonte de alimentação.
Dentro da cadeia alimentar, muitos primatas podem servir também como presa para diversas outras espécies, incluindo outros primatas. Os chimpanzés, por exemplo, caçam outros macacos, principalmente filhotes e jovens adultos, e alimentam-se de seus cérebros.
Além disso, algumas aves de rapina, como o gavião-pega-macaco e o gavião-real, são conhecidas pro predarem saguis e outras espécies de macacos nas árvores. Mesmo espécies maiores de primatas, também podem ser predadas por grandes aves ou serpentes.
Características gerais dos primatas
Cérebro grande, olhos voltados para a frente e polegares opositores são algumas características que todos os primatas têm em comum. Além disso, podemos avaliar seu aspecto geral de diversidade e distribuição. Veja a seguir.
■Classificação dos primatas
A classificação dos primatas engloba oito denominações, de acordo com as características de cada espécie. Os Prossímios incluem primatas inferiores e társios, os Antropoides são os símios ou macacos. Já o termo macaco é genérico e inclui todos os macacos do Velho e do Novo Mundo, com exceção dos hominoides.
Os “Hominoides” referem-se aos gibões, orangotangos, gorilas, chimpanzés e humanos. O grupo dos “Hominineos” contempla gorilas, chimpanzés e humanos. Já o grupo formado só por chimpanzés e humanos é chamado de “Homininos”.
No grupo dos “Humanos” estão todas as espécies do gênero Homo: os Australopitecos, os Parantropos, os Ardipitecos, os Keniantropos, o Orrorin e o Sahelanthropus, todas já extintas, com exceção do ser humano atual.
■Espécies
De acordo com a Sociedade Brasileira de Primatologia, existem hoje no mundo 665 grupos de primatas, incluindo uma enorme variedade de espécies, algumas delas já familiares para nós: os lêmures de Madagascar, os grandes macacos da Ásia e da África (macacos do Velho Mundo) e todos os diversos macacos do mundo tropical (macacos no Novo Mundo), mas também espécies raras, que continuam sendo descobertas.
De acordo com dados mais recentes, apenas entre os primatas não humanos são reconhecidas 522 espécies divididas em 80 gêneros. Esse número sobe para 709 quando consideramos também as subespécies. Novas espécies e subespécies estão continuamente sendo descritas, totalizando mais de 200 novos grupos nos últimos 30 anos.
■Distribuição e habitat
Os primatas sobrevivem nas regiões equatoriais de três continentes: das florestas tropicais do sul do México à fronteira norte da Argentina; do grande arquipélago da Indonésia às montanhas do sudoeste da China; e mais espetacularmente, em toda a imensidão ancestral da África, desde as savanas e matagais subsaarianos, passando pelas fortalezas da Bacia do Congo, até a África do Sul.
Como já foi discutido neste artigo, as espécies de primatas que viviam nos polos foram extintas, restando apenas grupos que vivem próximos aos trópicos, principalmente em áreas de florestas. O que dificulta entender toda sua história. Isso acontece pois, com o grande volume de matéria orgânica dessas regiões, é mais difícil a preservação dos fósseis.
■Estado de conservação
Como os primatas vivem prioritariamente em regiões de florestas, a presença humana e consequente desmatamento colocam muitas espécies em risco. Hoje estima-se que mais de um terço de todos os primatas estejam vulneráveis ou criticamente em perigo de extinção.
Macacos de maior tamanho sofrem riscos ainda maiores, pois sua reprodução é mais espaçada, resultando em um menor número de filhotes. Além da perda de habitat, essas espécies também sofrem com a caça de populações, que se alimentam da carne desses primatas.
No Brasil, encontramos a maior diversidade de primatas do mundo. Porém, com o grande desmatamento da Mata Atlântica, muitas dessas espécies estão em perigo, como é o caso do macaco-prego e de todas as espécies de mico-leão
Fantásticos primatas!
Como aprendemos neste artigo, macacos, lêmures, társios, loris e humanos pertencem ao mesmo grupo dos primatas. Eles surgiram na Terra há mais de 65 milhões de anos, com características corporais próprias para escalar galhos de árvores e viver como arborícolas.
Com as mudanças do planeta, ao longo dos anos, muitas espécies de primatas foram extintas. No entanto, a evolução de alguns grupos acompanhou essas modificações e permitiu que os primatas recentes tivessem sucesso adaptativo nas regiões centrais do Globo Terrestre.
Já nós, humanos, temos uma longa história evolutiva a ser contada. Mas, hoje, nossa espécie é a única não extinta do gênero Homo. Por isso, podemos nos considerar primatas sobreviventes!
Bióloga e escritora